DA DITADURA MILITAR À REDEMOCRATIZAÇÃO: CAMINHOS DA TEORIA HISTÓRICO-CULTURAL NA PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO BRASILEIRAS (ANOS 1970 A 1990)
FROM THE MILITARY DICTATORSHIP TO REDEMOCRATIZATION: PATHS OF HISTORICAL-CULTURAL THEORY IN BRAZILIAN PSYCHOLOGY AND EDUCATION (1970's TO 1990's)
DOI:
https://doi.org/10.33362/professare.v11i3.3074Palavras-chave:
Vigotski, Processo educacional, psicologia histórico-cultural, redemocratização, história da psicologia, redemocratizationResumo
O presente artigo traça uma breve análise histórica do processo inicial de apropriação e difusão da psicologia histórico-cultural no Brasil, com foco no legado de Lev Semionovich Vigotski (1896-1934). O objetivo da pesquisa que lhe deu origem foi identificar especificidades do contexto político brasileiro e seu desdobramento no trabalho dos grupos que impulsionaram esse processo de difusão. Para tanto, trabalhamos com teses, livros, artigos e dossiês que recuperam a história do legado vigotskiano entre os anos 1970 (ainda durante a ditadura civil-militar) e final da década de 1990. Nossa análise mostra o decisivo impacto da redemocratização na busca por referências mais adequadas à realidade brasileira (seja na educação ou na psicologia social), com ênfase no marxismo, assim como o redesenho das políticas educacionais no bojo da redemocratização que atravessou os anos 1980 e 1990 e que acabou promovendo Vigotski à condição de um dos mais populares autores da psicologia no campo educacional em nosso país. Concluímos nosso percurso apontando como essa popularidade desdobra-se no bojo de divergências sobre a natureza política e epistemológica do seu legado.
Palavras-chave: Vigotski, Lev Semionovich (1896-1934); psicologia educacional; psicologia histórico-cultural; redemocratização; história da psicologia.
ABSTRACT
This article outlines a brief historical analysis of the initial process of appropriation and diffusion of historical-cultural psychology in Brazil, focusing on the legacy of Lev Semionovich Vigotski (1896-1934). The objective of the research that gave rise to it was to identify specificities of the Brazilian political context and its unfolding in the work of the groups that boosted this diffusion process. To do so, we work with theses, books, articles and dossiers that trace the history of the Vygotskian legacy between the 1970s (still during the civil-military dictatorship) and the end of the 1990s. Our analysis highlights how the search for more appropriate references to Brazilian reality (whether in education or in social psychology), with an emphasis on Marxism, played a significant role in such legacy. This process also depended on the reshaping of educational policies in the wake of redemocratization that went through the 1980s and 1990s and ended up promoting Vygotsky to the status of one of the most popular psychology authors in the educational field in our country. We conclude our journey by pointing out how this popularity unfolds in the midst of disagreements about the political and epistemological nature of his legacy.
Keywords: Vygotsky, Lev Semionovich (1896-1934); educational psychology; historical-cultural psychology; redemocratization; history of psychology.
Referências
ANTUNES, M. A. M. A psicologia no Brasil: leitura histórica sobre sua constituição. São Paulo: EDUC, 1999.
ASBAHR, F. da S. F.; OLIVEIRA, M. L. S. de A. M. . Inventário dos grupos brasileiros de pesquisa na teoria histórico-cultural a partir do Diretório de Grupos do CNPq. Obutchénie. Revista de Didática e Psicologia Pedagógica, [S. l.], v. 5, n. 2, p. 566–587, 2021. DOI: 10.14393/OBv5n2.a2021-61477. Disponível em: https://seer.ufu.br/index.php/Obutchenie/article/view/61477 p. Acesso em: 6 mar. 2023.
BOMFIM, M. A América Latina: males de origem. São Paulo: Centro Edelstein, 1903/2008.
BOVO, A. C.; KUNZLER, A. P.; TOASSA, G. Da “Escola” ao" Círculo" de Vigotski: uma perspectiva historiográfica crítica. Memorandum, p. 1–23, 2019. Disponível em https://periodicos.ufmg.br/index.php/memorandum/article/view/6842/10743. Acesso em: 7 mar. 2023.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/introducao.pdf
CARVALHO, B. P. A Escola de São Paulo de Psicologia Social: uma análise histórica do seu desenvolvimento desde o materialismo histórico-dialético. Tese (Doutoramento em Psicologia Social). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2014.
COAN, I. B. F., ALMEIDA, M. de L. P. de. Histórico da proposta curricular de Santa Catarina. Holos, v. 6, p. 251-276, dez. 2015. DOI:10.15628/holos.2015.1738 p.
DUARTE, N. A escola de Vigotski e a educação escolar: algumas hipóteses para uma leitura pedagógica da psicologia histórico-cultural. Psicologia USP, v. 7, n. 1–2, p. 17–50, 1996. DOI: https://doi.org/10.1590/S1678-51771996000100002.
DUARTE, N. Concepções afirmativas e negativas sobre o ato de ensinar. Cadernos Cedes vol. 44, n.19, pp. 85-106. 1998. dx.doi.org/10.1590/S0101-32621998000100008
DUARTE, N. Vigotski e o “aprender a aprender”: crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. Campinas, SP: Autores Associados, 2000.
DUARTE, N. Educação escolar, teoria do cotidiano e a escola de Vigotski. Em: Educação escolar, teoria do cotidiano e a escola de Vigotski. 3. ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2001.
DUARTE, N. A teoria da atividade como uma abordagem para a pesquisa em educação. Perspectiva. vol. 21, n.2, pp. 279-301. 2002. Recuperado em 13 de fevereiro, 2018, de periodicos.ufsc.br/index.php/perspectiva/article/view/9646/8881
DUARTE, N. Formação do indivíduo, consciência e alienação: o ser humano na psicologia de AN Leontiev. Cadernos Cedes. vol. 24. n.62, pp.44-63. 2004. DOI: dx.doi.org/10.1590/S0101-32622004000100004
FERRARO, A. R.; ROSS, S. D. Diagnóstico da escolarização no Brasil na perspectiva da exclusão escolar. Revista Brasileira de Educação. vol.22, n.71. pp. 1-26. 2017, DOI: 10.1590/S1413-24782017227164
FREITAS, M. T. A. O Pensamento de Vygotsky e Bakhtin no Brasil. Campinas, SP: Papirus, 1994.
GARCÍA, L. N. Versiones tempranas de Vygotski: su recepción em la Argentina (1935-1974). Em: YASNITSKI, A.; van der VEER, R.; AGUILAR, E.; GARCÍA, L. N. (org.). Vygotski revisitado: una historia crítica de su contexto y legado. Buenos Aires: Miño y Dávila, 2016. p. 305-336.
GONZÁLEZ-REY, F. L. G. Encontro da psicologia social brasileira com a psicologia soviética. Psicologia & Sociedade, v. 19, p. 57–61, 2007. https://doi.org/10.1590/S0102-71822007000500019
HENTZ, P.; HERTER, M. L. Propuesta curricular de Santa Catarina y psicología histórico-cultural. In.: GOLDER, M. Vygotsky, psicólogo radical. Buenos Aires: Ateneo Vigotskiano de la Argentina, 2001.
LANE, S. T. M.; CODO, W. (org.) Psicologia Social: o homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 1984.
LEONTIEV, A. N.; LURIA, A. R.; VIGOTSKII, L. S. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 1988.
LONGAREZI, A. M.; PUENTES, R. V. (org.). Ensino Desenvolvimental: vida, pensamento e obra dos principais representantes russos I. 3a. ed. Uberlândia: Edufu, 2017a. 380p.
LONGAREZI, A. M.; PUENTES, R.V. (org.). Ensino Desenvolvimental. Antologia. Livro 1. 1. ed. Uberlândia: Edufu, 2017b. v. 1. 240p .
MACHADO, A. M.; SOUZA, M.P.R. (org.). Psicologia Escolar: em busca de novos rumos. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.
MARTINS, J. B. Da relação Vigotski e Leontiev-Alguns apontamentos a respeito da história da psicologia soviética. Interamerican Journal of Psychology, vol.47, n.1, pp. 43-51, 2013. Recuperado de https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=28426980006
MARTINS, J. D. S. A sociabilidade do homem simples: cotidiano e história na modernidade anômala. São Paulo: Contexto, 2011.
MAUÉS, F. Sou brasileiro, democrata e editor. Observatório da Imprensa, 18 nov. 2014. Disponível em: <https://www.observatoriodaimprensa.com.br/armazem-literario/_ed825_sou_brasileiro_democrata_e_editor/>.
MOLON, S. I. A Psicologia Social abrapsiana: apontamentos históricos. Interações, vol.6, n.12. pp. 41-68, 2001.
MORAES FILHO, E. de. A proto-história do marxismo no Brasil. In: MORAES, J. Q. de.; REIS FILHO, D. A. (org.). História do marxismo no Brasil. 2a ed. rev. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2003. i, p. 13-58.
NETTO, J. P. Nota sobre o marxismo na América Latina. Novos Temas, Salvador/São Paulo, vol. 5/6, pp.43-60, 2012.
NODA, M.; GALUCH, M. T. B. Políticas públicas de educação no ensino básico do Estado do Paraná: da dívida social à formação para o mercado (1980-2000). Revista HISTEDBR On-Line, vol.18. n.2, pp.545-569, 2018. https://doi.org/10.20396/rho.v18i2.8652356
PUENTES, R. V.; LONGAREZI, A. M. (Org.) . Ensino desenvolvimental: vida, pensamento e obra dos principais representantes russos, livro II (E-book).. 1a.. ed. Uberlândia: Edufu, 2017. 402p
REY, F. L. G. Encontro da psicologia social brasileira com a psicologia soviética. Psicologia & Sociedade, vol.19(spe2), pp.57-61. 2007. https://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822007000500019
SANTOS, M. R. dos. Seria a Teoria da Subjetividade uma vertente da Psicologia Histórico-Cultural? Psicologia em Revista. v. 26, pp. 269-284, 2020. https://doi.org/10.5752/P.1678-9563.2020v26n1p261-276
SARMENTO, D. F. A teoria histórico-cultural de L. S. Vygotsky: uma análise da produção acadêmica e científica no período de 1986-2001. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2006.
SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. Campinas: Autores Associados, 1995.
SMOLKA, A. L. B. A criança na fase inicial da escrita: a alfabetização como processo discursivo. 12. ed. São Paulo/Campinas: Cortez/Editora da Unicamp, 1987.
SMOLKA, A. L. B.; GÓES, M. C. R. de; LAPLANE, A. L. F. de. Desenvolvimento Humano: história, natureza e cultura. Cadernos CEDES, 35(spe), pp.329-332, 2015. https://dx.doi.org/10.1590/CC0101-32622015V35ESPECIAL154113.
SOUSA, E. A. D. Sílvia Tatiane Maurer Lane: dissertações e teses orientadas no Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Social na PUC-SP - uma contribuição aos estudos sobre a psicologia social no Brasil. Tese (Doutorado em Psicologia da Educação). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP, 2008.
THIESEN, J. da S. Vinte Anos de Discussão e Implantação da Proposta Curricular de Santa Catarina na Rede de Ensino: desafios para um currículo de base histórico-cultural. PerCursos, vol.8, n.2, pp.41-54. 2007. Disponível em http://revistas.udesc.br/index.php/percursos/article/view/1556. Acesso em 01 de Setembro, 2019.
TOASSA, G. Is there a “Vygotskian Materialism”? Ontological and epistemological concerns for a contemporary Marxist Psychology (Part I). Dubna Psychological Journal, vol.3, pp. 46-57, 2015. Recuperado de: https://www.academia.edu/download/43467346/GTOASSA_-_Is_there_a_Vygotskian_materialism_-_PART_II_-_DUBNA.pdf
TOASSA, G. 'Atrás da consciência, está a vida': o afastamento teórico Leontiev-Vigotski na dinâmica dos círculos vigotskianos. Educação & Sociedade (Impresso), v. 37, p. 445-462, 2016. https://doi.org/10.1590/ES0101-73302016144457
VILELA, A. M. J. (org.) Dicionário Histórico de Instituições de Psicologia no Brasil. Rio de Janeiro: Imago; Brasília, DF: Conselho Federal de Psicologia, 2011.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984.
VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
YASNITSKY, A. Aleksei N Leontiev’s research on memory and its meaning as the soviet avant-garde science of the future. Cadernos CEDES, v. 40, n. 111, p. 123–134, 2020. https://doi.org/10.1590/CC224304_IN
Downloads
Publicado
Como Citar
Edição
Seção
Licença
Copyright (c) 2023 Professare
Este trabalho está licenciado sob uma licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivatives 4.0 International License.
Autores que publicam nesta revista concordam com os seguintes termos:- Autores mantém os direitos autorais e concedem à Revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Attribution que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria e publicação inicial nesta Revista.
- Autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não-exclusiva da versão do trabalho publicada nesta Revista (ex.: publicar em repositório institucional ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial nesta Revista.
- Autores têm permissão e são estimulados a publicar e distribuir seu trabalho online (ex.: em repositórios institucionais ou na sua página pessoal) a qualquer ponto antes ou durante o processo editorial, já que isso pode gerar alterações produtivas, bem como aumentar o impacto e a citação do trabalho publicado (Veja O Efeito do Acesso Livre).